A evolução da figura do Diabo na sociedade ocidental


As chamadas Forças do Mal são, às vezes, tão poderosas ou mais poderosas do que as Forças do Bem. E a catástrofe é necessária à reconstrução. O raio que destrói, não raro prepara o caminho para o nascimento de algo melhor. Em suma, as Forças do Mal são imprescindíveis dentro do Universo, como o dia requer uma noite e esta mesma noite requer outro dia, assim Deus implica na existência do Diabo, como o Diabo implica na existência de Deus, como a Beleza só existe em função de uma Fealdade que a destaque, e vice-versa. O Diabo é um ser intradivino.
I – Origem
Um anjo inquieto que ousou discordar dos ditames de Deus, Todo Poderoso, sendo por isso desclassificado e expulso do céu, eis o que nos ensinam os teólogos sobre o diabo, apresentando assim como uma figura subversiva da hierarquia celestial.
Os gregos antigos que lhe deram o nome (dia-bolos: duas mortes, do corpo e da alma) viam na sua existência a personificação do Mal Supremo em contraste com as forças do Bem.
Os egípcios usaram o nome de Ató para Deus do Bem e Setesh para o Deus do Mal. Quando Moises fugiu com os judeus e estabeleceu a partir do Sinai uma religião que ficou sendo conhecida como a religião dos judeus, entre eles o Deus Bom era Adonai (Aton) e o Deus Mal era Shetin, ou seja, Satã (Setesh). Os primeiros cristãos, quase todos judeus, adotaram a ideia, de mistura com a teologia egípcia sobre Ísis e Hórus (Maria e Jesus). E Shettim ficou sendo Satã até hoje entre nós.
No principio a função de Satã era testar a fidelidade dos homens de Deus. Assim, recebeu ele de Jeová a missão de infligir sofrimento a Jó (Livro de Jó, Cap. I, versículo de 6 a 12). Quando o Velho Testamento foi traduzido para Latim a palavra diabolos veio grafada ora como diabolus (nas primeiras versões), ora como Satã (na Vulgata).
Como isso podemos aprender que o Diabo e Satanás são uma mesma “pessoa”, embora mais adiante, na própria Bíblia, eles sejam considerados como chefes de equipe, com legiões intermináveis de funcionários. A organização satânica é numerosíssima.

II – Demônios célebres
Citados na própria Bíblia, nominalmente, estão Enoch, príncipe do poder dos ares; Belzebu, chefe de todos os demônios, Asmodeus, espírito da libertinagem; Apollyon, o anjo das profundezas, Behemoth e Leviatã, Belial ou Lúcifer e outros da sua estirpe. Mas o diabo só foi oficialmente registrado no no ano 446 depois de Cristo no Concílio de Toledo, embora tenha aparecido no livro de Athanasius sobre a vida de Santo Antônio, escrito em 360 D.C. Enfim, um incontável número de santos foi tentado  pelo Demônio e sua existência ficou acima de qualquer dúvida.

III- O Bem e o Mal na antiguidade
As religiões antigas atribuíam a uma única divindade o poder de fazer o Bem e o Mal. Zoroastro, reformador da religião iraniana antiga, estabeleceu que dois espíritos gêmeos, o Bem e o Mal, submetiam-se a um Deus único. Mas esta concepção não durou muito e já no reino de Xerxes o dualismo apareceu, e assim, Ahriman, o espírito do Mal, foi considerado independente e adversário de Ahura-Mazda, o espírito do Bem, que também se chama Ormuzd.
O combate entre Alriman e Ahura-Mazda ou Ormuzd deverá durar doze mil anos e vai acabar com a vitória do Bem. Ormuzd, criador dos corpos celestes, mandará sobre à Terra um cometa explosivo que fundirá o planeta, purificando todas as almas. E Ahriman, que terá perdido a batalha, será também purificado e se confundirá com seu adversário, o Bem, numa eternidade pacífica e feliz.
As religiões antigas dos povos escandinavos estabelecem um dualismo mais complicado, na base de dois de um lado e dois de outro. Assim é que Alfader, pai da Natureza trabalha em equipe com Odim, Deus bom, contra Loke, símbolo do Mal, e seu cumplice Surtur, símbolo do Mal Físico.
Das Caraíbas à Patagônia o dualismo se estende sempre nessa base, com uma entidade boa tratando de vencer a entidade má. O mesmo principio é encontrado nas mitologias da Polinésia, da Austrália e Nova Zelândia.
A certeza de que a historia se repete entre povos e raças distantes no espaço e no tempo leva os teólogos a concluir que a universalidade dessas reações do espirito humano é a prova de que a crença em Deus e no Demônio esta baseada nos fatos.

IV – Histórias semelhadas
Entre os hebreus, a figura de Jeová podia se confundir com a de um demônio justiceiro, Senhor dos exércitos, ele preconizava a exterminação dos povos, mandava pragas de gafanhotos, pestes, epidemias e inumações contra os egípcios, enfim, gostava de ver correr sangue. Ditador do Universo, funcionava, absoluto, como o árbitro do Bem e do Mal, até que um dos seus funcionários (um anjo encarregado de inspirar sentimentos maus nos homens) revoltou-se e foi embora. Esse anjo rebelde ficou sendo o demônio, o subversivo, o traidor. Jeová então mandou seu filho sobre a terra para combatê-lo.
Há e sempre houve deuses e Demônios para todos os gostos e medidas. Nisso ninguém batia os gregos da Antiguidade que estabeleceram o Olimpo com verdadeira Hollywood de personagens gloriosas. Júpiter, Juno, Apolo, Vênus, Mercúrio, Vulcano, Ceres, Diana, Baco. Todos ótimos.
Os deuses gregos eram feitos a imagem e semelhança dos homens, gostavam de sexo, tinham inveja um dos outros, eram dados a fúrias e a amores incríveis. Júpiter se disfarçava em cisne para dormir com Leda, e na pele de um touro raptou Europa. Muito conveniente.
Havia tantos templos erigidos e tantos deuses na Grécia Antiga que São Paulo, ali chegando para pregar o Evangelho de Cristo, usou o altar ao Deus Desconhecido. É que com medo de omitir em suas preces qualquer divindade ciumenta, os helênicos haviam feito um templo sem nome, um altar ao Deus que ainda não fora mencionado no Olimpo, talvez por um descuido imperdoável.

V – Magia A.C. – D.C.
O Gnosticismo e o Neoplatonismo forneceram todos os temas, signos e símbolos da Magia da Idade média e da Renascença. O Ocultismo se propagou por tradição oral. A ideia era que todo o Conhecimento estava oculto na Natureza e só alguns poucos iniciados poderiam desvendar seus segredos e oferecer a chave dos Mistérios aos discípulos devotados. Através dessa porta eles recebiam a iluminação e o entendimento do Universo. Eram os primeiros passos no que mais tarde seria chamado de investigação científica.
Ao lado dessa tradição vinha outra, paralela, de bruxaria, chamada Goetia. Um conjunto de lendas e superstições, a mágica de Meroe e de Pamphile, restos de tradição hebraica, persa, etrusca, céltica, bizantina, romana e normanda, formado por livros de feitiçaria chamados grimoires, que ensinavam os aprendizes a convocar demônios, encontrar tesouros, atiçar paixões ou devastar inimigos.
A maior parte destes livros ocultos trazia, como autore, os nomes de magos legendários. O Rei Salomão era tido como sendo o primeiro dos grandes bruxos dessa leva. Moisés teria assinado vários, e também Honório, um Papa Diabólico.
Agrippa se considera herdeiro dos magos caldeus. Para ele, Jesus era um mago da Caldéia. E o Rei Salomão, um poderoso bruxo, detentor de todo Conhecimento Universal.
Outro livro, a Cabala, versão judaica do gnosticismo da época, pretende haver previsto o nascimento de Cristo. O satanismo só passa a existir quando os teólogos cristãos começam a estabelecer que todas essas artes mágicas do velho paganismo representavam um tráfico ilícito com o Demônio, inimigo da Igreja.
A magia céltica se misturava com a saxônica, retendo traços do folclore romano e tornada válida pelas proibições cristãs. Um sincretismo não muito diferente do que existe hoje no Brasil, onde as divindades de Umbanda e Quibanda convivem, tranquilamente, com os santos da Igreja. Naqueles tempos o Feitiço das Nove Ervas era praticado pelos bruxos com intercalações da oração do Padre Nosso.
Tudo muito misturado e muito confuso, como se vê logo no inicio de qualquer estudo sobre bruxaria. Mas uma coisa era básica: o uso de plantas alucinógenas, unguentos e filtros.
O fato é que já em 1677 as bruxas conseguiam com seus unguentos, alucinógenos ou não, realizar façanhas além da ciência. E entre os gregos da Tessália, muito antes de Cristo, Circe e Medéia, bruxas de prestigio, mudavam a água em vinho. Seria tudo isso hipnotismo, alucinação coletiva, ou simplesmente o uso de poderes extraordinários extraídos da própria Natureza?

VI - Jesus e os Demônios
Ora, se Jesus expulsava demônios dos corpos dos possuídos era porque acreditava neles. Também neles acreditavam os oficiais romanos dos tempos de Cesar, como nos prova o documento. Os filósofos mais céticos acham que Jesus, tendo encontrado a crença nos espíritos do mal já difundida entre seus compatriotas, havia preferido acomodar-se ao folclore para não proferir os preceitos da época. Isto seria transformar Jesus demagogo, o que ele certamente não era, pois morreu crucificado.
Todos os textos conhecidos que retratam Jesus como exorcista de demônios nos mostra que ele se referia às entidades taxando-as de forças personalíssimas. Afinal, ele próprio foi tentado no deserto pelo Diabo, um espirito mau definido. No episodio do menino endemoniado, (Mateus, 17 versículos 18 a 21) Jesus estabelece uma distinção entre os maus espíritos: - Esta espécie não pode ser expulsa senão pelo jejum e pela oração. Isto é, Jesus não somente acreditava nos demônios como os classificava de acordo com seu poder e sua hierarquia.
A lenda sagrada dividiu o exercito celestial em nove batalhões de anjos. Os serafins, os querubins, os tronos, os dominantes, os príncipes, os virtueiros, os poderosos, os arcanjos e os anjos.
Depois da chamada revolta dos anjos, os decaídos também se organizaram em divisões com príncipes e oficiais. Os autores desse fracassado golpe de estado no céu são os Príncipes dos Serafins Maléficos: Belzebu, Lúcifer e Leviatã.
Belzebu tenta os homens com Orgulho. Seu adversário é São Francisco de Assis. Lúcifer, o mais inteligente dos demônios, tenta com a Deslealdade. Seu adversário é São Paulo. Leviatã, o monstruoso, tenta com as Aberrações Humanas. Seu adversário é São Pedro.
No Evangelho de São Marcos, vemos um caso de possessão demoníaca na pessoa de um homem que vivia entre os sepulcros e nem mesmo com cadeias alguém podia prendê-lo. Já despedaçara os grilhões com que haviam tentado subjuga-lo. Andava de noite e de dia, clamando por entre os sepulcros e pelos montes, ferindo-se com pedras.
Quando, de longe, viu Jesus exclamou, com alta voz: Que tenho eu contigo, Jesus, Filho de Deus Altíssimo? Conjuro-te por Deus que não me atormentes.
Porque Jesus lhe dissera: Espirito imundo, sai desse homem! – E perguntou-lhe: - Qual o teu nome? – Respondeu ele: Legião é o meu nome, porque somos muitos. – E rogou-lhe, encarecidamente, que os não mandasse para fora. Ora, pastava ali pelo monte uma grande manada de porcos. E os espíritos imundos rogaram a Jesus dizendo: Manda-nos para os porcos, para que entremos neles.
Jesus permitiu. Então, saindo os espíritos imundos, entraram nos porcos; e a manada, que era cerca de dois mil, precipitou-se despenhadeiro abaixo, para dentro do mar, onde se afogaram.
O episodio da transferência dos espíritos imundos para a manada de porcos tem desencadeado discussões entre teólogos, exegetas da Bíblia, e os psiquiatras ateus interessados em ver no fenômeno apenas um caso de histeria combinado com uma passagem de magnetismo animal. No entanto, os porcos ficaram marcados na História como avatares dos Demônios e até hoje sua carne é desprezada por árabes e judeus.

VII – O Demônio no cérebro
Mesmo fora da Igreja alguns estudos sérios têm sido feitos no sentido de determinar, cientificamente, até que ponto devemos procurar nos defender do Capeta. Nesse campo, o primeiro trabalho organizado de um leigo foi o do Professor William Forbes, da Universidade de Glasgow, Inglaterra, que estudou profundamente o tráfico dos homens com o Diabo a partir de 1730.
A bruxaria é a arte de realizar milagres com a assistência do Demônio. – dizia ele, com absoluta segurança.
Mais modernamente entram os adeptos da teoria do Inconsciente Coletivo, numa revolucionária interpretação das teses de Jung. Segundo Beatrice Mahler, da Universidade de Columbia, o cérebro humano está preparado para receber do exterior não apenas os impulsos sensoriais conhecidos (cheiro para o nariz, cores para os olhos, sons para os ouvidos, formas para o tato, etc.), mas também, em certos estados especiais, como o transe hipnótico, impulsos gestálicos que propiciam a existência de uma consciência marginal. Nestes casos o cérebro humano seria governado de fora e assim o paciente estaria agindo por controle remoto, manobrado por uma entidade exterior que poderia modificar os elementos fundamentais da sua razão e induzi-lo a praticar atos estranhos, falar línguas desconhecidas, ganhar força sobre-humana etc.
Essa entidade exterior que atua sobre um cérebro ou vários cérebros de uma comunidade, em momentos especiais, à maneira de um inconsciente coletivo, seria chamada de Demônio. O fenômeno das epidemias sociais, do tipo Hitler e o Nazismo, quando um líder faz um povo inteiro praticar atrocidades, cegamente, estaria dentro desta tese de Beatrice Mahler. Nos casos isolados, quando um indivíduo parece ter recebido o Demônio e está realizando o impraticável, é apenas o paciente desta entidade exterior que se aninhou em algum departamento do seu cérebro como um alter ego.

VIII - Sabbats
O sabbat tradicionalmente parece ter nascido no Século XIV, como uma espécie de reunião permissiva, orgíaca, em oposição às cerimonias da Igreja, antes castas e bem comportadas. Daí o nome de Missa Negra, ou missa do lado oposto.
O termo sabbat (derivado da palavra hebraica que significa o sétimo dia) pretendia associar os judeus às artes do Demônio. Era a discriminação religiosa daquele tempo, tanto que também se usava a palavra synagoga para descrever um sabbat.
Era, no princípio, uma reunião de subversivos, cujas ideologias e teses conflitavam com as da Igreja. A Inquisição depressa os classificou de traidores de Deus, agentes das forças do mal e, por consequente, sócios do Demônio. Suas reuniões começaram como paródias da liturgia cristã, missas inversas, missas negras, e admitiam orgias, atos sexuais bárbaros com animais e celebrações heréticas.
Os teólogos distinguem duas espécies de pacto. O privado (Professio Tacita) e o público (Professio Expressa). O juiz da Inquisição, Paulus Grillandus (1525), foi dos que usaram esta classificação com requintes de sadismo. Ele torturava as vítimas por dias seguidos até obter a confissão da espécie exata de pacto em que o iniciado estaria envolvido. Se realizado durante um sabbat (público), ou a domicílio mesmo.
Um salto no tempo e vamos encontar em Londres de 1974 o bem frequentado Club Stânico dirigido pelos bruxos de col reoulé, Crowley e Price. Lá os pactos ainda são procurados e assinados. Em Paris há mais de dez mil pessoas rendendo culto religioso regular a Stã. Na California os rituais satânicos já começaram a preocupar as autoridades, sobretudo depois de uma série de crimes cometidos sob o nome de Lúcifer. Nigúem até hoje esqueceu a morte trágica da estrela de cinema, Sharon Tate, esposa do estranho diretor Romam Polanski (O Bebê de Rosemary), sob efeitos de um ritual satânico induzido por um bruxo moderno, Manson, criminoso praticante de magia negra.
Enfim, quem duvida leia Présence de Satan Dans Le Monde Moderne, da autoria do Monsehor Cristiani, com o Nihil Obstat da Igreja. Parece que o Diabo é muito seletivo e só se associa com gente que lhe dá trela.

IX - Bruxos e magia
A busca pelo contato com o Demônio é remotíssima, anterior aos egípcios, caldeus e babilônios. Seus ritos variaram fantasticamente no espaço e no tempo. Até antes de 1350, na Europa, buscava-se a assistência do Diabo em reuniões de bruxaria, que eram confundidas com feitiçaria, ou a sobrevivência de superstições pagãs, anteriores a Cristo, quando o conjunto de práticas mágicas funcionava como religião e os primeiros sacerdotes ainda não se tinham apropriado dos folclores tribais para dominar seus fiéis.
Nos primeiros séculos da era cristã essa bruxaria – ainda na fase de feitiçaria – só era punida com a morte se suas práticas resultassem ferimentos. As curas e as adivinhações, embora consideradas heréticas, gozavam de certa tolerância. Só no século XIV começaram as leis canônicas a ficar mais severas em relação às praticas bruxísticas.
Em 1310 o Concílio de Treves proibiu as adivinhações, o fabrico de filtros do amor ( poudres pour l’amour), as conjurações e quaisquer cerimonias não católicas. Em 1432 o Bispo de Bézieres deu início à excomunhão de feiticeiros. A Igreja, por essa época, admitia, sem maiores investigações, os acontecimentos milagrosos. Os santos estavam em grande moda e cada taumaturgo que se retirava para o deserto e voltava contando histórias de visões diabólicas, sensuais e malévolas, acrescentava um ponto à crença na tentação de Stanás.
A Igreja admitia o milagre, sim, mas opunha-se a que os milagres fossem conseguidos com a ajuda do Demônio. E a Inquisição começou a torturar, condenar, executar, enviando à fogueira pessoas que fossem suspeitas de manter algum tráfico com o Demônio.
Ao Demônio se atribuíam todas as novidades ou descobertas. Os alquimistas começaram a ser considerados bruxos. A esses e, posteriormente, aos irmãos da seita Rosa Cruz, foram atribuídos os seguintes poderes: A transmutação dos metais; O prolongamento da vida; O conhecimento do que se passa em locais afastados e A aplicação da Ciência Oculta na descoberta de objetos escondidos.
Todas as ordens de Cataristas, Waldenses e Templarios foram perseguidas como demoníacas ou organizadas contra o poder secular da Igreja para destruí-la. Em 1486 a cajadada mestra sobre bruxos – ou quem quer que se asselhasse ales -  foi desfechada. Um livro terrível, o Malleus Maleficarum (Clava Contra as Bruxas), escrito por Jakob Sprenger e Heinrich Kramer, monges dominicanos, veio à luz. Reunia velhas teses de outro livro, datado de 1435, o Formicarius (Formigueiro), de Johannes Nider, e lançava novos anátemas contra as feiticeiras. Tudo em nome de Cristo e com fundamentos na Biblia, (Exodo, cap. 22. versículo 18: - À feiticeira não deixarás viver).
O Malleus Maleficarum transformava todos os retalhos de velhas tradições pagãs em um credo severíssimo sobre o culto do Mal, seus participantes – que se organizavam em sabbats ou em seitas de hereges – e os malefícios que sabiam causar. Prescrevia o uso de tortura para extrair confissões, levava o pânico aos espíritos desarmados, deixando entrever o fim do Cristianismo e da Humanidade se medidas extremas e urgentes não fossem tomadas contra os bruxos. Apesar de escritos por frades católicos, o livro não deixou de impressionar também os protestantes caçadores de feiticeiras depois da Reforma. A única diferença ficou sendo a maneira de despachar as vitimas deste para o outro mundo. Os protestantes as enforcavam, enquanto os católicos preferiam enviá-las à fogueira.

X - As feiticeiras de Salém
O diabolismo teve seu grande registro colonial na América do Norte de 1692, na cidade de Salém, comunidade altamente puritana da Nova Inglaterra onde as crenças no Sobrenatural eram profundas (até porque o Estado de Massachusstts, na época, não constituía uma monarquia nem uma republica, mas uma autentica teocracia).

XI - Magia no Brasil
Não há bruxaria expeculativa no Brasil. Os cultos de Umbanda e Quimbanda, trazidos da África pelos escravos, fizeram aqui, com as nossas tradições indígenas, rituais de pajés e outros elementos folclóricos, todo um sincretismo religioso muito mais perto da superstição do que da magia tradicional.
Umbanda é um culto prestado à Divindade Absoluta, força universal, mãe de todas as manifestações do Bem.
Quimbanda é o culto prestado à Divindade Maléfica, ou ao Demônio nas suas várias formas. No Brasil os trabalhos de Quimbanda são muito numerosos e podem ser vistos comumente nas sextas-feiras à meia-noite, nos chamados despachos em encruzilhadas, em lugares ermos, ou à beira d’água. Os cultos de Umbanda e Quimbanda são praticados em pontos de reunião denominados tendas e terreiros. Os espíritos cultuados pelos adeptos de Umbanda integram diversas espécies: Elementais, Espíritos humanos, os santos ou orixás, os caboclos, os pretos, os Exus.

XII - O Vodu do Haiti
A supertisção africana levou para o Haiti outra espécie de culto: o vodu, ou vudu. No Daomé a palavra quer dizer espírito, mas no pais negro da América Central serviu para abranger toda uma série de ritos, praticas mágicas e cultos ao Bon Dieu.

XIII – Conde de Cagliostro e a Pedra Filosofal
Entre os grandes expoentes das sociedades secretas do século XVIII surge o nome carismático de José Bálsamo, o Conde de Cagliostro, alquimista dos Rosacruzes, mago curandeiro de doenças incuráveis e detentor dos segredos de transmutação da matéria.
Percorreu toda Europa vendendo suas poções mágicas, especialmente uma que se chamava Àgua de Juvêncio e tinha poderes rejuvenescedores não menos eficazes do que o de certos geriátricos de algumas famosas personalidades médicas atuais.
Por volta de 1785 chegou a Paris e fez um enorme sucesso, ganhando as boas graças da nobreza e da burguesia. Como Rosa–cruz entrou nos movimentos maçônicos e instituiu, de sua lavra, uma maçonaria egípcia com a qual pretendia restaurar em cada seguidor a pureza inicial do ser humano e suas potencialidades mágicas naturais. Infelizmente Cagliostro não dedicava todas as horas do seu dia ao labor misterioso de alquimista no caminho da Pedra Filosofal. Gostava de meter-se em politica e era chegado ao contrabando de ouro (quem sabe fabricado por ele próprio, no laboratório de casa). Afinal levava uma vida de príncipe e era preciso arranjar muito dinheiro para sustentar o padrão.
Muito pouco sobrou dos ensinamentos de Cagliostro, por conta da Inquisição seus documentos foram queimados. Alguns preceitos, apenas, conseguiram atravessar os séculos. Como este:
- “É perfeitamente possível que alguém, iluminado pelos altos poderes da Magia, possa ter visões de futuro e determinar o que vai acontecer nos anos seguintes e até nas décadas e séculos que estão por vir, mergulhando no mistério do Tempo e lendo as linhas do Livro da Vida como se tudo já houvesse de fato acontecido”.
Os Físicos da nossa era espacial, a partir da teoria do espaço-tempo de Einstein, têm levantado hipóteses que não estão muito longe dos lances metafísicos do senhor Conde de Cagliostro.

XIV - Sociedades secretas
Apesar do caos da Revolução Francesa o Ocultismo continua a reunir adeptos na Europa sob o ângulo já de investigação científica. Enquanto isso na esclarecida Inglaterra, o Mago de Marylebone, Francis Barrett, continuava a afalar de demônios e hierarquias satânicas. No seu livro, The Magus, segue os preceitos de Agrippa e Abano e até usava termos análogos. Para ele, todo o Conhecimento estava com o Diabo.
Também é curioso e altamente informativo o livro do ocultista Eliphs Levi, ex-abade e poeta. Nas páginas do seu Transcendental Magic ele nos fala de teorias e experiências preternaturais numa linguagem acessível e num estilo impecável. O assunto magnetismo é ai várias vezes abordado sob o ângulo dos espíritos do mal.
Inspirada no livro de Levi, a médium rosa-cruz Helena Petrovna Blatavtsky, da Rússia, organizou em 1875 a Sociedade Teosófica. As doutrinas divulgadas pelo grupo eram, a princípio, de origem oriental, compiladas do Budismo e combinadas com a Cabala, formando uma curiosa mistura de gnosticismo e otimismo.
A partir dai as sociedades secretas se desenvolveram e multiplicaram e toda Europa chegando até a América. É quase impossível manter registro de todas elas. Rosacruzes, Teosofistas e Espiritualistas se subdividiram em milhares de grupos e lojas.
Os avanços tecnológicos e todos os mais aceitáveis preceitos da moderna psicanalise não conseguiram banir da mente humana a crença no Demônio. O medo nasce do cansaço e da solidão, dizem os jovens filósofos dialéticos, para quem o Diabo é uma teoria capitalista.
O fato é que as bruxas continuam acontecendo nas pequenas e nas grandes cidades do mundo. Hoje em Londres, as bruxas falam na televisão. Algumas são até muito bonitas. Nos Estados unidos existem atualmente dezenas de escolas de bruxas, umas secretas outras inteiramente abertas a qualquer curioso. As universidades da Califórnia já estão incluindo cursos de Ocultismo em seus currículos e as bibliotecas e livrarias de qualquer parte do mundo, hoje, exibem mais livros sobre o Demônio do que sobre qualquer dos santos ou profetas. A que se deve isso? Por que estamos mergulhados nesta onda satânica?

XV - Os vampiros
Um cronista alemão de Dusseldorf, comentando, o sucesso que o demônio Pazuzu conseguiu nos Estados Unidos, depois do advento do filme O Exorcista, fez a blague inevitável: - Agora não acreditamos mais no Diabo. Ele resolveu naturalizar-se americano.
Um salto no tempo e vamos encontrar o Diabo, em 1780, sob o disfarce dos vampiros, atuando em Dusseldorf, em Leipzig, na Bavária, com sobrenomes alemães já no final do século XVIII. Sim, os Demônios sempre tiveram um penchant pela terra de Goethe, Dr. Fausto não foi uma coincidência.
Não há melhor lugar para uma expansão dos projetos satânicos, convenhamos, do que a terra do Tio Sam, onde todos os mais poderosos meios de comunicação ficam ao seu alcance. Os vampiros foram os grandes iniciadores da demonomania americana. Um folclore importado da Transilvânia, da tradição magiar e dos alemães. Um tema fascinante.
Demônio, homem, morcego, criatura apavorante que chupa o sangue das mulheres adormecidas. Almas penadas, mortos vivos, egressos do Inferno, devolvidos às cidades para aterrorizar e perder os cristãos tementes a Deus. Um mundo de variações em torno do mesmo tema: o vampiro é um cadáver ambulante que se revitaliza com o sangue de suas vitimas.
Notáveis escritores se deixaram fascinar pelo assunto: Goethe escreveu A Noiva de Corinto, em 1797, a primeira grande novela de terror, do gênero vampiresco. A balada Leonora, de Burgher, traduzida por Sir Walter Scott em 1794, voltou a trazer o demo-morcego à baila, com grande ênfase. O Vampiro, de Lord Byron, publicado em 1819, também fez tremer os corações. Até Baudelaire e o Marques de Sade entraram no assunto.
A origem do vocábulo vampiro é magiar. A primeira vez que surgiu na Inglaterra foi em 1734, numa descrição ocultista.
Dom Augustin Calmet, no seu Traité sur les apparitions (1751), afirmou que os Demônios vampiros só se tinham dado a conhecer nos últimos sessenta anos e suas presenças apenas registradas na Hungria, na Morávia, na Silésia e na Polônia. A Grécia e a Albânia também abrigavam lendas análogas, sendo que nesses países o Lobisomem é mais popular.
O vampiro propriamente dito é reconhecido sob dois ângulos. Um como o avatar de Satã, isto é, um morcego que se transforma em homem mas na verdade é o Diabo; outro como o espirito de uma pessoa morta que regressa ao próprio cadáver mas não pode se mostrar à luz do dia. Esta é a versão mais comem e aterroriza populações há vários séculos.
Diabos ou almas penadas, os vampiros tiveram sua fase áurea no sudeste europeu no final do século XVII e começo do século XVIII. Documentos de ocorrência desse gênero nos falam do terror em Belgrado, no ano de 1725, na Sérvia, em 1825, e em Danzing, já em 1855. Há discussões teológicas arquivadas na Universidade de Leipzig sobre tão estranho assunto. Entre muitas, a Dissertatio de Vampiris Serviensibus, do Professor John Heinrich Zopft, que chegou a descrever essas aparições como “entes de fatal malignidade”.
Mas o que desafia a imaginação dos especuladores é o detalhe da imagem do vampiro não se refletir no espelho. Todas as lendas repetem o mesmo dado curioso, intrigante. Por que a imagem do vampiro não se reflete no espelho?
Os modernos parapsicólogos têm sua explicação. Segundo Grasset as aparições de mortos, fantasmas ou vampiros nada mais significam do que elucubrações do inconsciente num efeito de criptomnésia. É a chamada memória do oculto, ou seja, alguém, no passado, ouviu uma história, uma lenda de terror qualquer, sentiu-se amedrontado e procurou esquecer o episódio O dado oculto na sua mente, isto é, tão esquecido que quando recordado nem parece lembrança. Um dia, mediante estímulos exteriores especiais – uma noite de tempestade ou brumosa, cheia de sons lúgubres, por exemplo – excita o inconsciente que encontra aquela lembrança oculta, arquivada. O paciente, numa ilusão crida pela própria mente, avista o vampiro sinistro. Mas, desde que se trata de uma simples projeção do inconsciente, a imagem do vampiro não tem reflexo no espelho.
No entanto, crentes preferem dizer que o vampiro é uma das muitas metamorfoses do Diabo e, como espirito da negação, perdeu sua própria imagem: não se pode refletir. O vampiro foge do crucifixo, como qualquer Demônio, e dos espelhos porque o denunciam.
Um nobre escocês, Sir Ian Mocreiffe, se diz descender do terrível personagem romeno do século XV. Esse lord vasculhou sua árvore genealógica até descobrir a condessa romeno-húngara, Elisabeth Bathory, que viveu entre os séculos XVI e XVII e foi considera uma autentica vampiresa, banhando-se em sangue de virgens para manter-se sempre jovem. Ela seria descente direta do Conde Drácula.
Dois estudiosos do assunto, Raymond Me Nally e Radu Florescu, escreveram um livro extremamente informativo, A la recherche de Drácula. L1Histoire, la legende, le mythe, onde provam a existência de um príncipe sanguinário da Valáquia, no ano de 1448, com o nome de Vlad Drácula, o Empalador, cujas façanhas abomináveis teriam inspirado o autor inglês Bram Stoker na concepção da novela que deu fama aos vampiros em 1897.

XVI – A parapsicologia e o eterno impasse
O Padre Oscar G. Quevedo em sua notável obra, A Face Oculta da Mente, com argumentação muito sólida, procura explicar, à luz da Parapsicologia moderna, os fenômenos de endemoniamento, de aparições, de milagres de bruxos, assim como os mistérios da transmissão de pensamento, da adivinhação, do conhecimento do futuro e das comunicações com o Além. No livro estão alinhados diversos estudos sobre a xenoglossia (fenômeno em que a pessoa fala línguas estrangeiras sem tê-las aprendiso), sobre a criptomnésia (memoria de coisas ocultas) e de todos os talentos do inconsciente praticamente desconhecidos de todos nós. Segundo ele, a Telepatia sobre o Inconsciente Excitado seria a melhor explicação cientifica para boa parte dos prodígios realizados em tendas e terreiros, antessalas de bruxos ou pátios de milagreiros.
O brilhante Padre Quevedo, a nosso ver, liquida com o Diabo em sua obra. E, não sabemos bem por que, voltando para o lado oposto, nos lembramos de uma história a respeito de certa inscrição nos muros de uma Igreja na Alemanha. Dizia assim:
DEUS ESTÁ MORTO (assinado) Frederico Nietzsche
Dois dias depois apareceu, noutro muro de outra Igreja, esta inscrição curiosa:
FREDIRICO NIETZSCHE ESTÁ MORTO (assinado) Deus
Que o Demônio, desde a serpente do jardim do Éden até a Bomba Atômica, tem estado presente, ao menos como ideia incomoda, na mente da Humanidade, disto não resta a menor duvida. Mas dai a chamá-lo pelo nome de batismo vai uma grande diferença.
Só haverá um meio - e poético – de reconhecê-lo. Na ausência do amor. Na angustia que se apodera de nós quando, havendo experimentado a graça de uma paixão sublime, e um dia a perdemos. Esse vazio é o Demônio.
Há momentos em que sinceramente duvidamos da sua existência, mas depressa nos vem ao espirito a frase de Baudelaire: - A maior esperteza do Diabo é justamente fazer com que não acreditemos nele. E então identificamos, nessa inclinação para duvidar, a astúcia maior do anjo das sombras, sua mais sutil forma de tentação.

Por: Jadson Luan
XVII - Referências Bibliográficas
A Doutrina Secreta, H.P.Blavatsky. Editora Pensamento. São Paulo. 
ABC do Ocultismo, Papus. Editora Martins Fontes. São Paulo. 
Aspectos do Ocultismo, Dion Fortune. Editora Pensamento. São Paulo. 
Devivier: A História da Inquisição - do manual de apologética do Pe. Devivier, S.J. 
Dogma e Ritual da Alta Magia, Eliphas Levi. Editora Pensamento. São Paulo. 
Experiências Práticas de Ocultismo, J.H. Brennan. Editora Ediouro. São Paulo. 
História da Magia, Eliphas Levi. Editora Pensamento. São Paulo. 
João Bernardino Gonzaga: A Inquisição em Seu Mundo, Editora Saraiva, 1994. 
Magia Hermética, Israel Regardie. Madras Editora. São Paulo. 
Magia Sexualis, P.B.Randolph. Editora Tahyu. São Paulo. 
O Diabo sem preconceitos, José Alberto Guerreiros. Editora Monterry Limitada. Rio de Janeiro, 1974. 
O Grande Arcano, Eliphas Levi. Edirora Pensamento. São Paulo. 
O Livro de Thoth, Aleister Crowley. Madras Editora. São Paulo. 
Sistemagia, Adriano Camargo Monteiro. Madras Editora. São Paulo.
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