Historicamente, a atividade cientifica, assim como os progressos mais expressivos na ciência foram atribuídos aos homens. Os séculos XV, XVI e XVII, foram marcados por diversos eventos e mudanças na sociedade decorrente sobretudo, da obra de Copérnico, das descobertas de Galileu e Kepler e do triunfo da filosofia mecanicista. Com isso, o prestigio da tradição mágica na sociedade erudita sofreu forte declínio. A corrente filosófica escolástica e a magia natural deram lugar à filosofia cartesiana. A separação do mundo do espírito do mundo da matéria foi um passo fundamental para o desenvolvimento da ciência, pois deixava intacto o poder e a autoridade da religião no primeiro, e permitia utilizar a experimentação para investigar o segundo.
No entanto, a passagem do universo mágico para o novo paradigma não foi simples e transparente. A mudança drástica ocorrida a partir do fim do século XV contemplava a demonização da mulher, principalmente da mulher sábia. Aqueles conhecimentos empíricos, que as mulheres dominavam e praticavam desde épocas ancestrais, foram considerados suspeitos. Afirmava-se que dada sua fraqueza física e moral, sua limitada inteligência, sua carência de raciocínio, sua sexualidade incontrolável e sua lubricidade, a mulher era a vítima privilegiada de Satã. Seu saber e seus misteriosos poderes só podiam ter sido adquiridos por meios ilícitos, pactuando com o demônio. Foi essa a imagem da bruxa, elaborada com amplos detalhes durante mais de um século por inquisidores católicos, padres protestantes e a elite burocrática criada pelos estados emergentes.
Mulher acusada de bruxaria "depondo" no Tribunal do Santo Ofício da Inquisição |
Algumas poucas mulheres aristocráticas exerciam importantes papéis de interlocutores e tutores de renomados filósofos naturais e dos primeiros experimentalistas. Não obstante, apesar de suas qualidades e competências não lhes eram permitido o acesso às intensas e calorosas discussões que aconteciam nas sociedades e academias científicas, que se multiplicaram no século XVII por toda a Europa e tornaram-se as principais instituições de referência da ainda reduzida comunidade científica mundial. No século XVIII, essa situação pouco se modificou e o acesso das mulheres a essa atividade, com poucas exceções, deveu-se principalmente à posição familiar que elas ocupavam: se eram esposas ou filhas de algum homem da ciência podiam se dedicar aos trabalhos de suporte da ciência, tais como, cuidava das coleções, limpar vidrarias, ilustrar e/ou traduzir os experimentos e textos. O século seguinte é marcado por ganhos modestos no acesso de mulheres às atividades científicas, como a criação de colégios de mulheres, mesmo assim, elas permaneceram às margens de uma atividade que cada vez mais se profissionalizava. Nessa época, as mulheres mais determinadas faziam experiências em suas cozinhas porque não eram aceitas em laboratórios. Marie Curie, por exemplo, prêmio Nobel de Física e de Química, só conseguiu seu primeiro emprego depois que o marido morreu.
A mudança nesse quadro inicia-se somente após a segunda metade no século XX, quando a necessidade crescente de recursos humanos para atividades estratégicas, como a ciência, o movimento de liberação feminina e a luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres permitiram a elas o acesso, cada vez maior, à educação científica e à carreiras, tradicionalmente ocupadas por homens.
No entanto, ainda perduram na idade moderna acontecimentos lastimáveis contra as mulheres que buscam carreira na ciência. Um bastante notório deu-se no observatório astronômico da Universidade de Harvard, um dos mais importantes do mundo. No final do século 19, Harvard queria desenvolver um sistema de classificação das estrelas. Entretanto, devido ao baixo orçamento existente na época para a realização da tal tarefa, foram contratadas mulheres físicas Anna Palmer, Williamina Fleming, Antonia Maury, Annie Cannon e Enrietta Leavitt, por terem um salário menor do que dos homens. O trabalho era baseado em cálculos complicadíssimos e os salários destas mulheres eram equivalentes aos de operários de obra. Pois bem, o sistema revolucionou a astronomia. Cannon desenvolveu um sistema de classificação de estrelas que foi adotado como padrão pela União Astronômica Internacional. Leavitt descobriu as estrelas variáveis que lhe deu o Prêmio Nobel de Física em 1925.
Rosalind Franklin |
Entre os nomes mais injustiçados da ciência moderna está o de Rosalind Franklin, a especialista em raios-X , associada ao descobrimento mais importante do século 20, a estrutura em dupla hélice do DNA. Suas fotografias chegaram às mãos de James Watson e Francis Crick sem o conhecimento da autora e possibilitaram Watson, Crick e Maurice Wilkins a receberem o Prêmio Nobel em 1962, quatro anos após a sua morte. Franklin, apesar de seu papel fundamental nesta descoberta, até recentemente, não tinha o seu nome envolvido nas histórias do descobrimento do DNA.
Ainda mais recente, uma pesquisa mostrou que quando se trata de ciência, as mulheres não são tão lembradas quanto os homens. Análise feita no Reino Unido, apontou que dois terços da população não sabem o nome de nenhuma cientista. E isso ocorre principalmente entre os jovens (tanto moças quanto moços) – 90% deles não conhece uma figura atual ou histórica feminina da ciência. Quase todos, no entanto, conseguiram lembrar-se de um cientista famoso (na maior parte dos casos o nome citado foi Albert Einstein). A Royal Society, responsável pela pesquisa, descreveu os resultados como frustrantes. Mas, apesar de não conhecerem cientistas mulheres, pais e mães disseram que se sentiriam felizes se as filhas seguissem essa carreira.
Esta situação não pode ser permitida a persistir. Em princípio, mulheres e homens são iguais e, portanto, merecem igualdade de oportunidades. Mas não é apenas sobre a igualdade de gênero, visto que proporcionar a abertura de fronteiras cientificas para as mulheres é bom para a sociedade e a economia como um todo. As grandes potenciam europeias, por exemplo, apesar da sua expressiva ascensão cientifica enfrentam numerosos desafios económicos e sociais, incluindo a crescente concorrência global, a recessão, as alterações climáticas e o envelhecimento da população. Estes irão exigir o máximo de todas as suas reservas de criatividade e inovação para superar a crise.
Tendo em vista tudo que fora exposto antes fica claro que esta resenha não tem apenas a pretensão de listar todos os cientistas mulheres ao longo da história. Mas também, fornece uma prova clara de que as mulheres cientistas, mesmo quando as probabilidades estão contra eles, são iguais aos homens. Exaltando as conquistas das mulheres do passado podemos proporcionar às mulheres hodiernas, modelos e exemplos de aspiração em sua busca pela excelência científica.
Por: Jadson Luan
Referências:
Jacqueline Leta. As mulheres na ciência brasileira: crescimento, contrastes e um perfil de sucesso Estud. av. vol.17 no.49 São Paulo Sept./Dec. 2003.
Lucia Tosi. Mulher e Ciência - A Revolução Científica, a caça às bruxas e a ciência moderna. Cadernos pagu (10) 1998: p.369-397.
Esqueceram também de falar de uma mulher que contribuiu muito para a área tecnológica, onde até hoje existe um certo machismo na área
ResponderExcluirhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Ada_Lovelace
Fico muito grato pelo comentário. Coincidentemente eu estou redigindo uma postagem que dará continuidade a esta breve historização da mulher na ciência, neste post eu falarei sobre as mulheres que mais se destacaram em suas áreas de pesquisa, Ada Lovelace será uma delas, aguarde!
Excluir